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terça-feira, 7 de outubro de 2014

Abordagem sistêmica no cuidado à saúde

   Na tarde hoje, dia 1° de Outubro, no Salão de Atos do Conjunto III do Centro Universitário Franciscano, a professora e doutora Adriana Dornelles Carpes, do curso de Farmácia, reuniu reflexões extremamente importantes para a formação acadêmica, no que diz respeito à “Abordagem sistêmica no cuidado à saúde”, tema da palestra. O evento dá continuidade às atividades do XVIII Simpósio de Ensino, Pesquisa e Extensão (SEPE), que iniciou hoje (confira a programação aqui).

O que quer dizer abordagem sistêmica?

A história da “Abordagem sistêmica” nasceu com Ludwig Von Bertalanffy, biólogo austríaco, que propôs o termo abrindo para uma ideia de estudo e pesquisa na ciência, contrapondo princípios da visão cartesiana, que diz que todo objeto de estudo deve ser isolado o máximo possível para observar todos fenômenos em torno deste em específico. Assim, pesquisa tem que ser algo restrito ao objeto pesquisado. Porém, Ludwig afirma em sua “Teoria Geral dos Sistemas” que, quando este objeto não está isolado dos meios, ele também apresenta outras respostas.

Tabagismo
Adriana Dornelles/Foto: Divulgação

Ele sugeriu que se deve estudar sistemas globalmente, de forma a envolver todas suas interdependências, pois cada um dos elementos, ao serem reunidos para constituir uma unidade funcional maior, desenvolvendo qualidades que não são visíveis quando analisados de forma isolada.
   Nessa perspectiva, a professora acredita que "no processo formativo, sempre há uma ideia do ponto de chegada. A vida traz incertezas, e frequentemente o trajeto necessita de mudanças. O profissional é um eterno aprendiz, estando sempre no processo de construção do conhecimento.”

Cuidados com a saúde

A professora Adriana Carpes diz que falar de saúde e doença, é falar de condição de vida no dado momento do sujeito. E isso teve variação ao longo das épocas. Na idade média, as doenças eram associadas a causas sobrenaturais, ligadas diretamente à religião, que explicava esse processo de adoecimento vinculado a fenômenos da natureza, como os astros.
Logo, com o surgimento da filosofia, que visa a compreensão da existência, buscou-se a explicação desses problemas e sobrepujou-se as respostas do que era justificado pela religião. Assim, a filosofia assumiu um status maior da explicação dos problemas de saúde.
Já na idade moderna e contemporânea, entrou a visão cartesiana nos processos que envolviam o adoecimento, e a religião foi descartada como causa explicativa das doenças. Essas três épocas exemplificadas  mostram que sempre houve um caráter detentor da verdade na condição de explicar esses processos de adoecimento.



Quais os ganhos da racionalidade da ciência?

Conforme a palestrante, a racionalidade da ciência acompanha a evolução da sociedade há muito tempo. O surgimento do fogo na pré-história, por exemplo, representou um significativo ganho nas atividades diárias do homem, aumentando, inclusive, sua expectativa de vida. A ciência, apesar de desconhecida, estava presente nos modos de obtenção de fogo até o seu emprego, que justificam os consideráveis ganhos na época, como o declínio de infecções alimentares (pois os alimentos passaram a ser cozidos e assados, não mais crus), o aumento da defesa contra outras tribos e predadores, a ajuda no combate ao frio e a luz durante a noite.
Em contrapartida, Adriana nos traz para uma época totalmente distinta, onde podemos citar o surgimento da Penicilina em 1929, pelo escocês AlexanderFlaming. Trata-se do primeiro antibiótico que se tem relato, ajudando consideravelmente no tratamento de doenças, sendo um fungo que interage com os micro-organismos bactericidas, inibindo sua atividade e, consequentemente, protegendo a pessoa. A mais pura ciência sendo aplicada nos cuidados à saúde.

Abordagem sistêmica no cuidado à saúde

Adriana Dornelles destaca que "o complicado objeto do nosso cuidado são as pessoas, sendo necessário refletir certas posturas que estamos tendo. Os profissionais de saúde não estão contemplando a abordagem sistêmica. Se a pessoa é nosso objeto, devemos destinar à ela todo conhecimento, buscando melhorar todas suas condições. E não deve-se esquecer que este ser é multi-dimensional, necessitando de muita atenção, como a fatores psicológicos, sociais, espirituais e biológicos."

Palestra foi o segundo evento do XVIII SEPE
Foto: Ezekiel Dall'Bello
Partindo de tal pressuposto, considerando que a saúde é a interação de várias dimensões humanas, como estilo de vida, bens e serviços, biologia e ambiente, levantamos questionamentos, ela questiona: " Será que a formação do profissional da saúde está abordando todas essas dimensões, inerentes ao tratamento das pessoas?"

Para a professora  é preciso "abrir a cabeça" para todas possibilidades a fim de compreender a ciência da saúde humana, cedendo espaço na mente para a compreensão daquilo que vai além do ofertado pela faculdade.  Segundo ela, os processos de hoje podem não ser os mesmos de amanhã. É indescritível e, em parte, inimaginável a mudança epidemológica da sociedade em três décadas. "Se há 30 anos atrás as crianças morriam desnutridas, hoje sofremos com a obesidade. Será que o profissional que se formou da década de 70 está apto, apenas com sua formação, para tratar com a obesidade? Será que esse problema era estudado na formação acadêmica da época?", questiona.
 Para Adriana, a resposta se dá através da multidisciplinariedade (uma matéria complementando a outra) e logo, por meio da interdisciplinariedade (pensar junto os diferentes conteúdos). E defende ser irracional a “parte” representar o “todo”, pois antes do médico ser especialista, ele era um “generalista”, conhecedor de várias matérias. Hoje, domina e admite, em muitos casos, apenas sua especialização. "Onde se perdeu esse profissional completo? Os seis anos da graduação foram jogados fora, trocados pelos dois de especialização?", indaga.


O “X” da questão

O que Adriana Carpes tenta  traduzir é que a abordagem sistêmica visa impedir que os profissionais se formem ou continuem atuando com as mentes fechadas para outros campos ou para as diversas dimensões que situam o ser humano. As consequências, segundo ela, é a limitação das atividades do conhecimento e, particularmente, do tratamento de doenças e cuidados com a saúde. Bem como, ainda, a dificultação de ampliar os horizontes nos campos de conhecimento estudados ou à restrição de alguma atividade por sua segmentação.
Para finalizar o alicerce da abordagem sistêmica nos cuidados com a saúde, utilizou-se a palestrante de valiosos conceitos de escritores que conseguem sintetizar referida linha de pensamento, dos quais se segue Edgar Morin, esclarecendo o que há de vago e resumindo o que já é preciso.

 “...Efetivamente, a inteligência que só sabe separar fragmenta o complexo do mundo em pedaços separados, fraciona os problemas, unidimensionaliza o multidimensional. Atrofia as possibilidades de compreensão e de reflexão, eliminando assim as oportunidades de um julgamento corretivo ou de uma visão a longo prazo. Sua insuficiência para tratar nossos problemas mais graves constitui um dos mais graves problemas que enfrentamos...” (MORIN, 1999, p. 13 a 14)

      No trecho acima, Morin afirma que a ciência segmentada limita o entendimento das questões fundamentais que norteiam nossa existência, caracterizando-a não como uma solução, mas como um problema de pensar frente ao problema enfrentado, seja de saúde ou social. Abaixo, o autor ratifica tal afirmação ressaltando que a ciência, a despeito de seu profundo estudo, especialização e pesquisa, nem sempre é enquadrada como fator benéfico à sociedade, mas também um limitador a esta, que por vezes se vê refém de um ou outro profissional, pois o conhecimento é monopolizado e não-conjuntural.          

“...Assim, os desenvolvimentos disciplinares das ciências não só trouxeram as vantagens da divisão do trabalho, mas também os inconvenientes da superespecilização, do confinamento e do despedaçamento do saber. Não só produziram o conhecimento e a elucidação, mas também a ignorância e a cegueira...” (MORIN, 1999, p. 14)


Por Ezekiel Dall'Bello.

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