Por Nayara Lunkes, Camila Porciuncula e Dérveson Martinelle
Segundo pesquisas organizadas
pelo diretório de grupos de pesquisa (DGP) do Conselho Nacional
de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq/MCTI), no decorrer dos anos tem se
percebido o visível aumento de mulheres no âmbito da pesquisa. Em 2010, de 128 mil pesquisadores cadastrados na base
de dados, cerca de 49% eram mulheres. Uma comparação pode ser feita no ano de 1995, em que, de cada 100 pesquisadores 39 eram mulheres.
O DGP retrata também as
divisões da pesquisa dentro do universo de especializações e áreas. As ciências humanas (59%) e sociais (55%), lideram em maior poder de representação de pesquisadoras mulheres. Já nas áreas exatas, os homens são
mais representativos com (64%), sobretudo nas engenharias e na computação
(66%).
Noticiência traz parte da história de vida de algumas das pesquisadoras do Rio Grande do Sul que buscam oferecer sua
contribuição para o avanço da ciência.
Debora Missio
Bayer , investigadora na área de Hidrologia
Foto de Nayara Lunkes |
A menina Débora saiu de uma
pequena cidade do noroeste do estado do Rio Grande do Sul. Foi em Tucunduva que
Débora Missio fez seu curso primário até o terceiro ano do segundo grau. Sua
mãe professora de matemática e seu pai, sem curso superior, deram incentivo à
menina e mais dois irmãos que procuravam passar em uma Universidade Federal.
Uma oportunidade para o ingresso na faculdade surgiu com o Programa de Ingresso
ao Ensino Superior (PEIES) da Universidade Federal de Santa Maria, que realizava três provas nos últimos anos do ensino médio. Débora se saiu bem e
resolveu encarar o curso de matemática, pois sua afinidade era mesmo com as ciências exatas. Ela cursou um semestre do curso e
resolveu, pela sua aptidão em cálculos, fazer vestibular para engenharia civil. Passou e seguiu até o final do curso.
Durante o curso foi convidada para ser voluntária de um projeto orientado sobre
construção civil. Mesmo já trabalhando com a pesquisa, a aluna não recebia bolsa auxílio. Foi quando passando por um corredor da Universidade viu uma seleção na
área de hidráulica para bolsista do Programa Institucional de Bolsas para
Iniciação Científica (PIBIC). Entregou o currículo e foi selecionada. Depois
daí, ela mudou a sua visão sobre
pesquisar.
No final do curso Débora
casou-se com o doutorando em estatística Fábio Mariano Bayer e, então, se torna
Débora Missio Bayer. Por estímulo da pesquisa que já havia feito durante a
graduação e pelo seu atual marido, resolve seguir os estudos e passa em um mestrado
em Saneamento Ambiental na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), onde
Fábio havia passado no doutorado em estatística.
No mestrado ela estudou
contaminação de áreas alagadas com óleo diesel, porém sem muita afinidade pela
área decide inscrever-se em no doutorado em hidrologia para que pudesse
continuar a linha de pesquisa na mesma área do doutorado, aproximando-se do que
mais gosta, e voltar ao Rio Grande do Sul. Hoje ela se divide entre Porto Alegre onde faz seu doutorado, e Santa Maria
onde seu marido mora.Com o doutorado finalizado, ela pensa em ser professora em Universidade Federal, e levar suas
pesquisas na área de hidrologia em pararelo às aulas e orientações.
“Na
Universidade Federal temos que atender o
ensino, pesquisa e extensão. Então ser professor Universitário antes de ser
pesquisador você é professor.”
Sobre a mulher
na pesquisa, Débora não viu em seu período
acadêmico e pesquisas , muita discriminação com as mulheres. Porém quando
estagiava na graduação, havia um certo cuidado por parte dos professores nas
obras gerenciadas pelas futuras engenheiras civis. Ela conta que sempre foi
respeitada, mas que precisou ter pulso firme, pois muitos homens trabalhavam no local.
Sibila Rocha –
doutora em Comunicação
Foto de Nayara Lunkes |
“A
questão do crescente número de mulheres na pesquisa não é um fato isolado,e está
ligado ao ingresso das mulheres nas Universidades. Essa busca da mulher pelo
mercado de trabalho também as leva para as Universidades. E nesse local é onde
existe a construção do conhecimento científico.”
Sibila é santa-mariense e vem de
uma família em que os pais fizeram curso superior. Seu pai foi um dos primeiros
médicos de Santa Maria, e sua prioridade era o estudo. Sua mãe também
santa-mariense saiu na década de 40 e foi para Pontifícia Universidade do Rio
Grande do Sul (PUCRS) estudar história.
Sibila iniciou seu curso de
jornalismo na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), fazendo parte da
primeira turma do curso.
“Esse
interesse pela pesquisa vem também com os programas de pós graduação. Pois a
graduação é um conhecimento horizontalizado, já o mestrado e o doutorado são
conhecimentos verticalizados, em que você deve contruir uma nova proposta.”
Como não havia muitos cursos de
pós graduação, ela decide ingressar no mercado de trabalho. Mas na década de 80
ela decide voltar a estudar pela necessidade de entender os processos pelos
quais ela era responsável, e aí vem sua primeira especialização na Faculdade de
Comunicação Social (Famecos) em Porto Alegre. Foi no final da década de 80 que
também foram instaurados os Trabalhos de Conclusão de Curso (TCC), esses que
remeteram as primeiras reflexões sobre pesquisa.
Sibila resolve seguir na vida
acadêmica e vai para o Rio de Janeiro na Universidade Federal do Rio de Janeiro
(UFRJ), fazer mestrado. E foi quando passou a conviver com pessoas que
pensavam em pesquisa, com professores que eram autores de livros, e ela se sentiu
ainda mais motivada em seguir em suas pesquisas. Em seguida,decide fazer
doutorado na Universidade do Vale dos Sinos (Unisinos).
Sobre a mulher na pesquisa, diz:
“A
mulher na minha época não tinha só que querer mas tinha que mostrar que sabia e
podia fazer pesquisa.”
Marlove Fatima
Brião Muniz - doutora em Fitotecnia
Foto de Nayara Lunkes |
Nascida em Candiota interior de
Bagé, em uma família de agricultores, Marlove não tinha incentivo ao estudo.
Porém, o que os jovens da época pensavam era ir estudar em uma cidade maior e
poder ter uma vida melhor.
Em seis irmãos, três meninos e
três meninas, as moças foram estudar e
os meninos ficaram para ajudar na lavoura.
Procurando uma perspectiva de um futuro melhor, as meninas faziam
magistério e trabalhavam.
Marlove decide fazer vestibular
e faz sua inscrição para agronomia, em uma turma composta de 50 alunos, e na qual apenas duas mulheres faziam parte. Ela conta que não tinham muito
incentivo de pesquisa mesmo dentro da academia, a intenção era apenas ter uma
graduação. Quando chegou o fim do curso Marlove se deparou com o mercado de
trabalho. Fez alguns concursos mas não conseguia chegar até o final, pois para
trabalhar na lavoura, os selecionados sempre eram homens.
Foi então que surgiu uma
possibilidade com a abertura das bolsas de incentivo a recém-formados pelo
CNPq. Inicia-se a partir dai o convívio com a pesquisa e pesquisadores em Pelotas
na Embrapa envolvida por essas bolsas, onde ficou por três anos.
Em Pelotas surgiu o interesse
de fazer mestrado e seguir estudando. No final do mestrado ela opta por
conhecer outros lugares e, com uma bolsa, ela decide ir para Goiânia na Embrapa.
Depois de dois anos ela passa em um doutorado na Universidade Federal do Rio
Grande do Sul (URGS) em Porto Alegre. A carreira de pesquisadora estava
iniciando junto da carreira de docente também. Durante o doutorado foi para
Santa Catarina a convite para lecionar em uma Universidade particular. Porém, com uma perspectiva de estabilidade em 2002 fez concurso para a UFSM em Santa
Maria e passou.
Ela hoje continua atuando como
professora no curso de agronomia e sua linha de pesquisa é patologia de
sementes.
Amanda Eloina Scherer – pós-doutora em Linguística
Foto de Yuri Weber |
Em
Santa Maria, Rio Grande do Sul, no ano de 1951, nascia Amanda Eloina Scherer.
Ainda jovem foi seduzida pela linguagem e os diversos desdobramentos da língua
portuguesa.
Ela
conta que seu interesse surge em Mariluz, no município de Imbé, onde passava as
férias, quando criança, junto de seus primos e tios numa casa que pertencia à
família.
O
que mais chamava a sua atenção era uma senhora, avó de seus primos, que
aparentemente não falava. Comunicava-se através de sinais, mas à noite Amanda
ouvia a voz desta senhora que falava em alemão com os netos. Fora reprimida por
uma ditadura que extinguiu o idioma alemão no Brasil e, então, a partir daí,
não sabendo o português, comunicava-se através de gestos.
É
desse momento que surge o interesse pela língua, de forma mais específica: como
a língua constitui o sujeito e como o sujeito é constituído pela língua. E
ainda, situações extremas, como esta, podem levar ao mudismo no mundo da
língua.
Após
concluir os estudos, a jovem Amanda ingressava no curso de Letras da
Universidade Federal de Santa Maria. Não sabia ela, que construiria uma
história que serve de exemplo para qualquer estudioso.
Em
seu doutorado trabalhou com três campos do conhecimento dentro da linguagem:
semiótica, lingüística e comunicação.
Desde
2000 é pós-doutora, tendo estudado na Universidade de Rennes, na Bretanha,
França. Ali pesquisou sobre história de vida e dinâmica de linguagem, história
de vida de professor versus história
de vida profissional, e como isso se mistura na vida do sujeito docente.
Antes
de iniciar sua carreira na Universidade, Amanda foi diretora de escola
municipal, coordenadora pedagógica da escola Hugo Taylor, trabalhou no Colégio
Cilon Rosa, na Escola Duque de Caxias e foi diretora da extinta Aliança
Francesa de Santa Maria.
Em
agosto de 2013 ela completa 42 anos de profissão. Nos 31 anos de UFSM, 20
destes foram dedicados ao ensino do francês. Há 12 anos trabalha no
departamento de Lingüística. Além de ensinar Lingüística na graduação, ministra
mais duas disciplinas na pós-graduação: História do conhecimento lingüístico e
Estudos da significação. Também na graduação já esteve à frente de disciplinas
como Francês 1-8, Literatura Canadense, Literatura Africana (sempre ligada ao
francês), Linguística Geral, Linguística Contemporânea, Língua e patrimônio,
Análise de discurso, História das ideias linguísticas, entre outras.
Em
2013 Amanda Scherer foi a professora homenageada pela Feira do Livro de Santa
Maria. Segundo ela, foi uma surpresa muito grande receber tal homenagem, e diz
sentir-se muito feliz, pois o “professor é um sujeito imprescindível para a
sociedade. Sem professor não há escola, sem escola não há escrita, sem escrita
não há leitura, sem leitura não há livro, sem livro não há feira”.
Hoje
sua pesquisa tem dois campos: o sujeito e a relação com a língua (Ex.: na minha
língua é melhor) e a história de instrumentos lingüísticos que ajudam a
sustentar a idéia de língua materna (história do dicionário no Brasil, história
da gramática no Brasil e manuais de ensino de língua).
“Ao
todo são 37 anos de UFSM, quatro anos de graduação, 31 anos de magistério e
dois anos de especialização.”
“Falando
eu me significo e significo o outro.”
Daniela Aline Hinerasky, doutora em Comunicação.
Arquivo Pessoal |
Daniela Aline Hinerasky, 34 anos natural de
Faxinal do Soturno, começou a sua trajetória como pesquisadora quando era bolsista do programa especial de treinamento no segundo ano de faculdade, cursado na UFSM, e durante esse tempo como uma de suas
prioridades em ser pesquisadora sempre acreditou nela mesma em ser uma grande
profissional de jornalismo. Logo
depois, Daniela fez sua monografia e seu foco foram as “Tendências de Programação
da RBS Tv”. Ela estudava as comunidades imaginadas dos produtores culturais na
emissora, e seu objetivo foi mostrar o ponto de vista de quem trabalha no grupo dessa
comunidade gaúcha a quem eles se referiam.
Depois de formada resolveu fazer um projeto não
apenas estudando a parte dos profissionais e sim a programação oferecida. A RBS
tem o interesse de mostrar programas mais urbanos, tradicionalistas uma tendência
urbana voltada para o gaúcho da fronteira. Essa programação grande parte
voltada para os jovens como “Patrola” e “Curtas Gaúchas” com esses temas tendo
o interesse de identificar a representação do gaúcho que não é apenas viver na
fronteira como na cidade.
Em 2002 Daniela começou seu mestrado na URGS, sendo
um passo marcante na trajetória como pesquisadora, foi ai que ela resolveu se
dedicar realmente a isso. Durante o seu doutorado resolveu pesquisar também
sobre “Cobertura Jornalista da São Paulo
Fashion Week”, e desde então faz suas pesquisas no jornalismo e da comunicação da
moda. Em 2007 criou o blog “Retalhos”. Essa prática de blogar está lhe inserindo
no meio da cibercultura em constante adaptação onde tem uma grande adoração
também, trazendo sempre novos interesses. Quando decidiu escolher o seu
tema do doutorado, teve o incentivo da família, pois seu avô foi alfaiate
mais de 30 anos, sua vó era costureira, e assim fechando um ciclo de sua geração.
Daniela teve uma grande oportunidade de fazer seu estágio de doutoramento na
capital de Paris, onde pode concluir sua tese se tornando especialista nesse
assunto. Hoje ela participa de conferências em cursos em diversos estados e
também retornando a Paris no “GEMODE( Groupe d’étude sur la Mode) Grupo de
estudos de moda”.
Daniela é também professora dos cursos de
comunicação da UNIFRA e diz do grande incentivo que a instituição lhe deu no
término de suas pesquisa.
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